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Sofrimento existencial: uma reflexão a partir do documentário Solitário anônimo

 

ADENAIDE AMORIM LIMA

Doutoranda em Filosofia, UFSM

 Introdução

 Este texto reflete sobre aspectos do sofrimento existencial presentes no documentário Solitário Anônimo. Fundamentaremos-nos, principalmente, em duas propostas teóricas que nos ajudará a compreender o fenômeno do sofrimento existencial que julgamos estar imerso o Solitário Anônimo, personagem central do documentário. Primeiramente em Alfried Längle (2008), que a partir de uma perspectiva existencial-antropológica e analítica discute tipos de sofrimento, dentre eles o sofrimento existencial, caracterizando-o; posteriormente, analisaremos o sofrimento existencial no contexto do sentimento existencial de Matthew Ratcliffe (2020; 2011), ao estabelecer uma intrínseca relação entre o sofrimento existencial e o desespero ou perda de esperança.

O documentário, um curta-metragem de dezoito minutos, narra uma história que aconteceu e foi registrada no ano de 2006. Um homem de setenta e oito anos de idade foi encontrado caído no gramado de uma pequena cidade do interior de Goiás chamada Bela Vista. Ele estava bastante debilitado e testemunhas disseram que ele estava delirando no idioma francês. Descobriu-se que, como parte de um plano para morrer, ele havia parado de comer. Foi encontrado em seu bolso parte desse plano, um bilhete informando a data em que foi escrito, 20/09/2006 e que dizia o seguinte: “A quem se interessar possa. Meu nome: Solitário Anônimo, não tenho família nem parentes nesta região do país”. O portador do bilhete tinha como objetivo evitar muitas questões, mas ocorreu justamente o contrário.

Débora Diniz, antropóloga e produtora do documentário conta, em algumas entrevistas disponíveis no YouTube, que estava ministrando um curso no Ministério Público do estado de Goiás quando foi procurada por uma promotora que queria nomeá-la como perita no referido caso (o que ela não aceitou), pois mesmo muito debilitado, o AS (abreviação de Solitário Anônimo) tentou argumentar que ele queria morrer em paz, que esse era um direito constitucional seu e que o referido direito estava sendo violado. A promotora dizia não saber o que fazer: não sabia se as pessoas tinham o direito de decidir sobre a própria morte e, em caso positivo, se seria da forma que ele havia planejado.

De acordo com Débora, o SA foi muito inteligente, pois a única maneira que o Estado não pode nos obrigar a viver é quando paramos de comer. A justiça se viu entre alimentá-lo compulsoriamente ou conceder a ele o direito de decidir sobre a sua própria morte. O que prevaleceu foi à primeira alternativa, por meio de uma ordem judicial, SA foi internado e obrigado a se alimentar, ele tentou resistir à assistência médica, mas foi em vão, ele foi obrigado a viver. Em uma publicação intitulada A vida depois do doc, de 2011 (https://carmattos.com), Carlos Alberto Mattos informa que após poucos meses de recuperar a saúde o SA veio a falecer, o texto não informou a causa da morte.

Foi justamente essa recusa em querer viver do SA que nos instigou a querer compreender esse fenômeno que nos chegou virtualmente por uma tela, mas trata-se de uma história de alguém real, mas em uma situação singular e que nos faz refletir sobre a nossa relação com o mundo de um modo muito distinto e, ao mesmo tempo, espantado.

 

  1. Entre o sofrimento existencial e o sentimento existencial

 

Conforme esclarece Alfried Längle (2008), na perspectiva existencial-antropológica, há diferentes tipos de sofrimento “[...] aprofundadas através de uma elaboração da essência do sofrimento” (p. 1). Já o modelo analítico é utilizado para analisar o conteúdo e a forma do sofrimento.  O autor ressalta que são muitas as maneiras de sofrer tendo em vista que o sofrimento é múltiplo, tanto em sua forma, quanto no seu conteúdo, ou seja, em relação às causas ou razões para um determinado sofrimento.

Ao questionar por que as pessoas sofrem, como resposta, Längle (2008) baseia-se nas três dimensões antropológicas elaboradas pelo neuropsiquiatra Viktor Emil Frankl, denominas de “clássicas”: a somática ou física, a psicológica e a espiritual/pessoal. Längle, porém, acrescenta uma dimensão “dinâmica”, que considera a relação da pessoa com o mundo, que o autor denomina de “realidade dialógica da pessoa com o mundo, a que chamamos ‘dimensão existencial’” (p. 1). Neste contexto:

 

O sofrimento existencial evoca sentimentos de futilidade, de falta de sentido. Esta forma de sofrimento surge de uma falta de orientação para um contexto mais vasto, no qual podemos compreender a nossa vida e as nossas actividades, o nosso sucesso ou o nosso destino sem sentido (LÄNGLE, 2008, p. 1, grifos do autor).

 

Para Längle, estas seriam as formas possíveis de sofrimento. A pessoa que sofre pode participar de uma destas dimensões ou combinar mais de uma delas, a depender da situação em que se encontra. É do nosso interesse a quarta dimensão do sofrimento, o sofrimento existencial combinado, às vezes sim, outras vezes não, com o sofrimento psicológico. Quanto ao grau e a intensidade do sofrimento na vida de uma pessoa, isso dependerá de vários fatores pessoais como a fase da vida em que a pessoa se encontra, seu modo de viver, aceitação ou não das condições que gera o sofrimento, etc. Essas concepções de sofrimento elaboradas por Längle (2008) nos ajuda a compreender os aspectos desse fenômeno apresentados no documentário pelo SA.

Quanto a concepção de sentimentos existenciais elaborada por Matthew Ratcliffe (2020), desenvolvida no âmago da fenomenologia das emoções, caracteriza-se por um conjunto de experiências não localizadas, mas que são experiências descritas como sentimentos e que referem-se a “[...] um senso abrangente de realidade e de estar enraizado em um mundo. Para a maioria de nós, [...] isso muda apenas de forma sutil. Entretanto, mudanças mais pronunciadas, que podem ser passageiras ou duradouras, são fenomenologicamente conspícuas e frequentemente comentadas” (p. 250). Diz respeito à forma de relacionar-se com o mundo, que não se encaixa em categorias familiares de humor, emoção ou estado de espírito, portanto, são sentimentos e ao mesmo tempo formas de relacionar-se com o mundo, “sentimentos de realidade e pertencimento” e que só são possíveis de serem descritas por meio de metáforas, analogias, etc.

Matthew Ratcliffe salienta que sua descrição do sentimento existencial é influenciada por Heidegger, William James e pelas discussões sobre o “sentimento de si” na filosofia e na psiquiatria, a partir do século XVIII. Para Ratcliffe (2020), os sentimentos existenciais constituem-se como uma dimensão da experiência humana que está além das categorias estabelecida de fenômenos, pois se constituem “[...] de um senso de realidade e pertencimento e sentido não localizado, algo que todas as experiências e pensamentos intencionalmente direcionados pressupõem” (p. 251). Ao distinguir os sentimentos existenciais de outras experiências, Ratcliffe (2020), estabelece duas características específicas desses sentimentos/experiências:

 

[...] são experiências essencialmente corporais. No entanto, eles não são exclusivamente corporais. Em vez disso, são relacionais - um sentimento do corpo é também aquele por meio do qual se experimenta outra coisa. [...] eles também constituem um senso de como a pessoa se encontra no mundo como um todo (RATCLIFFE, 2020, p. 251, grifos do autor).

 

Ratcliffe (2020) salienta que enquanto outros sentimentos “comuns” envolvem uma experiência relacionada com algo mais específico do cotidiano, tendo como pano de fundo esse relacionamento mais abrangente com o mundo, nos sentimentos existenciais o relacionamento é estabelecido com o mundo de forma mais ampla. O autor apresenta uma dinâmica dessa relação com o mundo, que faz parte desse conjunto denominado de sentimento existencial e que nos interessa que é o desespero ou falta de esperança. De acordo com Ratcliffe (2011): “A esperança pré-intencional é uma forma do que em outro lugar chamo de ‘sentimento existencial’. Sentimentos existenciais, eu sustento, desempenham um papel fenomenológico distinto: eles constituem uma sensação de encontrar a si mesmo no mundo” (p. 126-127).

O desespero seria a falta de esperança, apesar dessa falta ainda ser um sentimento existencial. É justamente neste aspecto do sentimento existencial ou pré-intencional que estamos interessados, pois é justamente ela que percebemos no SA e que nos interessa compreender como fenômeno relacionado com o sofrimento existencial de Alfried Längle. Como quando o mundo perde para o agente a sua palpabilidade familiar e se apresenta como algo estranho, desconectado, à parte.

 

  1. Explorando o caso do Solitário Anônimo

 

Ao definir o sofrimento existencial, Längle (2008) argumenta que, ligado às emoções, o sofrimento vem sempre acompanhado de sentimentos desagradáveis, sensação de perda, auto-alienação e, acrescentaríamos, no caso do sofrimento existencial, desespero, uma falta de sentido e de esperança, cuja destruição revela que algo vital foi aniquilado, esfacelado. Matthew Ratcliffe (2011) o descreve como “perda da confiança no mundo”; uma emoção pré-intencional que diz respeito  a perda de esperança frente a si mesmo e ao mundo, como descreve Alfried Längle:

 

Na perspectiva da Análise Existencial, uma experiência é vivida como sofrimento se ameaçar as estruturas fundamentais da existência. Estas estruturas fundamentais estão relacionadas com as quatro realidades fundamentais da existência humana: (a) o mundo e as suas condições, (b) a vida de cada um e a sua força, (c) a identidade de cada um e a sua relação com os outros, e (d) as exigências da situação e o horizonte da nossa vida (LÄNGLE, 2008, p. 6, grifos do autor).

 

O SA, ao tentar romper seus vínculos tangenciais com o mundo, uma vez que ele já havia rompido o vínculo existencial, diz: “Eu não tenho vínculos”, “Me joguei fora”. Ele interrompe, primeiramente, a sua ligação com os seus parentes consanguíneos e com seus amigos para, em suas palavras, sentir-se livre para agir, no caso, para morrer sem que essa morte afetasse àqueles por quem estava ligado afetivamente. Mas ele também tenta desconectar-se de uma parte mais ampla do mundo ao tentar passar-se por indigente, destruindo qualquer vestígio do seu lugar no mundo. O gesto de jogar fora o seu documento de identidade é sintomático deste não-querer ser identificado entre os seus semelhantes. Ele estava certo! Assim que foi identificado o seu nome, parece ter ativado conexões relacionando-o com contratos em seu nome, formação acadêmica, estilo de vida, familiares e demais fios condutores que os conectaram, contingencialmente, ao mundo, mesmo com a ausência de sentido.

Kierkegaard (2022) descreve o desespero como uma doença do espírito “no si-memo” para a morte. Ele argumenta que esse desespero pode assumir três formas: “[...] desesperadamente não ser consciente de ter um si-mesmo [...]; desesperadamente não querer ser si-mesmo; desesperadamente querer ser si-mesmo” (p. 129). Mesmo que identifiquemos o desespero do SA como sendo deste segundo tipo, desesperadamente não querer ser si mesmo, esse desespero é insuficiente para dizer algo sobre a sua relação como o mundo e descrever as “[...] mudanças profundas na experiência, que às vezes são descritas em termos de ‘habitar um mundo diferente’ ou de ter perdido algo fundamental para a vida” (RATCLIFFE, 2020, p. 252) e que extrapola “[...] os sentimentos de angústia, isolamento e desamparo que são fundamentais para as experiências em questão” (ibidem).

O escritor russo Liev Tolstói (1828-1910), em sua obra intitulada Uma confissão, reelabora e descreve a sua jornada pela busca de sentido para a sua existência e para o mundo no qual ele estava inserido. Em relação a sua experiência ele relata:

 

A vida me dava enjoo – alguma força indeterminada me seduzia para que eu, de algum modo, me desvencilhasse da vida. Mas não se pode dizer que eu queria me matar. A força que me atraía para longe da vida era mais poderosa, mais completa do que uma vontade comum. Era uma força parecida com a antiga aspiração de vida, só que voltada no sentido contrário. Com todas as forças eu desejava me afastar da vida. A ideia do suicídio me veio de uma forma tão natural quanto, antes, me vinham os pensamentos sobre o aperfeiçoamento da vida (TOLSTÓI, 2017, p. 36).

 

Diante de seu sofrimento e desespero, Tolstói narra que para ele se abria três possibilidades: o suicídio, a filosofia ou religião. Sem nos adentrar aos detalhes de sua jornada, ele não encontrou o que ele estava procurando na filosofia, mas encontrou na religião, ao encontrar o sentido na religião o suicídio deixou de ser uma opção. Para Längle (2008) “[...] a fé espiritual ou religiosa tem um valor especial porque pode dar um sentido para além de todas as exigências da situação. A fé pode abrir horizontes nas situações mais difíceis da vida e permitir uma compreensão mais profunda do que está a acontecer” (p. 4). Ratcliffe (2020), por outro lado, reforça que a conversão religiosa está relacionada à mudança de sentimento existencial. Ele sugere que “a ‘crença em Deus’ às vezes não consiste no endosso da proposição de que uma entidade específica existe, mas na expressão de um tipo de sentimento existencial, uma maneira de habitar o mundo que se presta à interpretação religiosa” (p. 254).

Pelo contexto, a partir das imagens e da fala do SA, ele compartilha com Tolstói desse mesmo “enjoo” pela vida, dessa força que o atraía para longe da vida e reforçava a sua vontade de morrer.  Mas, como isso ocorre para ambos em termos de possibilidades é totalmente distinto. No caso do SA, ele queria morrer em paz, essa era a sua vontade e o seu sofrimento aumentava à medida que ele via cada vez mais distante a possibilidade de alcançar se objetivo, cujo processo havia sido iniciado três semanas antes, quando parou de comer. De acordo com informações explicitadas por uma mulher não identificada, mas que parecia trabalhar no hospital em que o SA estava internado, SA “tem um conhecimento muito grande de filosofia, é muito crente em Jesus. De todo o evangelho, ele é conhecedor muito profundo”.

Não podemos relacionar conhecimento profundo de algo com uma crença, mas o fato é que, de acordo com Ratcliffe (2020), a orientação de fundo por meio da qual a mudança e a incerteza são atendidas varia em estrutura de pessoa para pessoa, pois o senso de possibilidade é experimentado de diferentes maneiras por cada um. Logo, para compreender melhor a experiência de uma outra pessoa é preciso que antes tenhamos abertura para isso, não podemos partir do pressuposto de que “[...] o mundo de outra pessoa é fundamentalmente como o seu e que quaisquer diferenças dizem respeito a experiências que surgem em um mundo comum, [do contrário] a pessoa permanecerá alheia a formas de experiência profundamente diferentes” (p. 253). Como tentaram convencer o SA de que a vida era boa.

O fato é que nem a filosofia e nem a religião foram suficientes para dar sentido à existência nesse mundo para o SA, abrindo a possibilidade cada vez maior do suicídio. Conforme Längle (2008), “[...] a incapacidade de reconhecer ou descobrir um sentido pode acontecer mesmo quando uma pessoa tem fé e esperança ou impregnada numa situação de sentido religioso. [...]. A falta de sentido está [...] ligada a um bloqueio de uma das condições fundamentais [...] para uma existência plena” (p. 5).

Ratcliffe (2020; 2011), descreve o desespero como perda de possibilidade, uma espécie de “[...] erosão ou perda da capacidade de experimentar e contemplar certos tipos de possibilidades. [...] o mundo [passa a ser] [...] desprovido da possibilidade de ‘qualquer coisa mudar para melhor’. [...] o mundo parece desprovido da possibilidade de esperança” (RATCLIFFE, 2020, p. 253), ou de que “não existe mais futuro” (RATCLIFFE, 2011, p. 253), que não se pode confiar no futuro. Ao detalhar o sofrimento existencial, Längle (2008) o descreve como a incapacidade de uma pessoa de responder ao mundo, não vale à pena imaginar o futuro, uma vez que o sentimento é de futilidade, nossas realizações são inúteis, nada de bom pode vir do futuro. “Se uma pessoa não consegue suportar o seu sofrimento porque não tem força suficiente, será incapaz de reconhecer qualquer significado numa situação, uma vez que é incapaz de perspectivar qualquer futuro para si” (LÄNGLE, 2008, p. 5).

O SA demonstra ter perdido essa perspectiva de futuro. Quando Débora Diniz lhe pergunta: “E o futuro?” ele responde: “Não tem futuro”. Quando ela indaga sobre a resposta que ele lhe havia dado antes, sobre o futuro ser uma mera probabilidade, ele diz que: “O futuro é uma hipótese”. Mas, o SA não rompeu sua ligação somente com o futuro, dimensão de tempo explorada por Alfried Längle e Matthew Ratcliffe, ele rompe também com o seu passado que para ele: “É um monte de lixo”. O presente, no entanto, é algo impossível de ignorar. Para o SA o presente “É o real”, é pesado e doloroso, é um tempo constante e por isso tenta fugir dele. Uma vez que não podemos ser nem no passado e nem no futuro e uma vez que o presente é sinônimo de sofrimento, nada resta para justificar e dar sentido a vida.

 

  1. Conclusão

 

No campo de estudo do sofrimento clínico, na grande maioria das vezes, o termo sofrimento existencial está relacionado ao sofrimento de pessoas acometidas de doenças graves progressivamente incapacitantes ou terminais. Trata-se de um sofrimento insuportável em que a pessoa não vê uma perspectiva futura positiva e que em muitos países esses pacientes tem a possibilidade recorrer à eutanásia ou suicídio assistido. Neste trabalho, sofrimento existencial possui mais uma dimensão filosófica, apesar de no caso do SA ter como desdobramento aspectos clínicos.

Há no documentário, analisado neste trabalho, outros tipos de sofrimento que poderia ter sido explorado em um contexto mais amplo, o que não é o caso aqui. Por exemplo, a dimensão do sofrimento objetivo, definido por Stan Van Hooft (1998), como o sofrimento que independe da consciência e reconhecimento da pessoa que sofre. Baseia-se em diferentes indicadores que podem ser julgados por uma terceira pessoa e que as levam a tomar decisões mesmo sem a anuência da pessoa que sofre. Outro tipo de sofrimento também a nível de exemplo que poderia ter sido explorado é o sofrimento iatrogênico que consiste em um sofrimento produzido pela própria tecnologia medicinal.

Diante da complexidade do fenômeno apresentado pelo documentário, podemos concluir que o Solitário Anônimo, nos impacta pelo seu modo de pensar, de ver o mundo, a si próprio e os outros. Débora Diniz nos apresenta um tema de modo bastante sensível e, ao mesmo tempo, muito impactante e que deixa transparecer de forma cristalina uma existência humana de sofrimento, de desencantamento com o mundo e, de certa forma uma existência forçada. Fica claro, ao assistir o documentário, que para aquele homem a vida é pesada e sufocante.

É inevitável o questionamento filosófico se vale a pena manter a vida e, com ela, o sofrimento. Sabemos que existem fármacos capazes de mudar a nossa perspectiva pessimista em relação ao mundo, porém, essa espécie de anestesia ainda é um recurso opcional. É fato que diante das pressões sociais, da falta de perspectivas quanto ao futuro, crises climáticas e humanitárias cada vez maiores esse tipo de sofrimento torna-se cada vez mais comum. É fato também que o sofrimento existencial, tema filosófico caro à tradição, merece ser abordado e meditado. O documentário nos permite essas e outras reflexões.

 

Referências

 

DINIZ, Débora (Produção/direção). Solitário Anônimo [vídeo]. Brasília; 2006. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=uTZEDtx8noU. Data de acesso: 07/07/2023.

 

KIERKEGAARD, Søren. A doença para a morte. Petrópolis: Vozes: 2022.

 

LÄNGLE, Alfried. Suffering-an Existential Challenge: Understanding, dealing and coping with suffering from an existential-analytic perspective. International Journal of Existential Psychology & Psychotherapy, vol. 2, n.1, 2008, p. 1-10.

 

RATCLIFFE, Matthew. Existential Feelings. In: SZANTO, Thomas; LANDWEER, Hilge. The Routledge Handbook of Phenomenology of Emotion. London: Routledge, 2020, p. 250-261.

 

______. What is it to lose hope? Phenomenology and the Cognitiv e Sciences, Springer Science+Business Media B.V., 2011, p. 1-19.

 

TOLSTÓI, Liev. Uma confissão.  São Paulo: Mundo Cristão, 2017.

 

VAN HOOFT, Stan. Suffering and the goals of medicine. Medicine, Health Care and Philosophy, 1, 2, 1998, p. 25-131.