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Turbulência política e dissolução do mundo

Renato Nunes Bittencourt

Doutor em Filosofia UFRJ

Zygmunt Bauman apresenta no conjunto de sua obra uma análise apurada do mal-estar da vida humana em uma ordem mundial cujos atores políticos hegemônicos evidenciam completo distanciamento em relação a um projeto social capaz de promover o estabelecimento do bem comum para o gênero humano. Guerras que no fundo são fomentadas pelo lobby das indústrias bélicas, ódio fascista em relação aos refugiados, depreciação das liberdades políticas e da constitucionalidade, irracionalismo e desvalorização da expertise científica, liquefação da ideia de verdade, descumprimento dos acordos ambientais são exemplos de algumas feridas de nossa conjuntura global que exigem uma reviravolta individual e coletiva para que essa marcha niilista seja interrompida e possamos tomar as rédeas do mundo e tentar talvez modificar esse processo de degradação de todas as esferas da sociabilidade. Para compreendermos nossa situação atual, precisamos, primeiramente, compreender o espírito da Modernidade.

A crise da Modernidade
A Modernidade trouxe em seu bojo a esperança concreta de mudança da ordem sociopolítica em favor do bem-estar da humanidade, encontrando no projeto filosófico do Iluminismo sua maior realização intelectual. A crença no progresso da técnica e do conhecimento como poder emancipador da humanidade dos grilhões da ignorância que tanto a fez viver no obscurantismo estimulava, na intelligentsia ocidental, uma onda de otimismo e de euforia em relação ao futuro. As transformações sociais de então reforçavam essa convicção. Kant disserta sobre tal expectativa de maneira bastante otimista:

Pouco a pouco diminuirá a violência por parte dos poderosos e aumentará a docilidade quanto às leis. Haverá, porventura, na sociedade mais beneficência e menos rixas nos processos, maior confiança na palavra dada etc., quer por amor da honra, quer por interesse pessoal bem entendido; e tal estender-se-á, por fim, aos povos na sua relação externa recíproca até à sociedade cosmopolita, sem que se possa minimamente ampliar o fundamento moral no gênero humano; para isso exigir-se-ia também uma espécie de nova criação (influxo sobrenatural). (KANT, 1993, p. 109)

Acreditava-se que a esperada autonomia da humanidade perante forças poderosas que até então a subjugaram violentamente enfim estava próxima de ser alcançada. Contudo, a Modernidade trazia consigo o gérmen da contradição axiológica, pois os benefícios da emancipação sociopolítica não foram destinados para todo o gênero humano, mas apenas para os brancos ocidentais que se arrogaram os condutores da ordem do mundo. Liberdade, Igualdade e Fraternidade, trinômio fundamental da filosofia iluminista e da Revolução Francesa, que despertaram os mais elevados afetos em seus defensores, restringiu-se a um distinto grupo de elite cultural. A mesma ordem econômica e política que promoveu transformações surpreendentes na organização social com seus benefícios técnicos chancelava a escravidão, a espoliação colonialista e a divisão axiológica do mundo entre civilizados e bárbaros, merecedores de toda forma de dominação em nome do progresso, palavra que se torna o mandamento da ação racional do sistema moderno. O progresso técnico da Modernidade não se associou ao progresso ético fundamentado na tolerância efetiva, no respeito pela alteridade e mesmo pela afirmação concreta da solidariedade internacional, gerando assim uma grande cisão intrínseca em seu dispositivo epistêmico. Nessas condições, a técnica se converteu em poder tirânico, tecnocracia, que favorece a dominação do homem sobre o homem e a exploração desenfreada da natureza, em nome da razão econômica do produtivismo. Nietzsche é um grande crítico do conceito de Modernidade, por considerá-la uma fabulação:

Ao contrário do que hoje se crê, a humanidade não representa uma evolução para algo de melhor, de mais forte ou de mais elevado. O “progresso” é simplesmente uma ideia moderna, ou seja, uma ideia falsa. O europeu de hoje vale bem menos do que o europeu do Renascimento; desenvolvimento contínuo não é forçosamente elevar-se, aperfeiçoar-se, fortalecer-se (NIETZSCHE, 1997, p. 17).

Cabe ressaltar que as objeções nietzschianas aos parâmetros axiológicos modernos não significam uma disposição reacionária pró-classicismo, mas sim a crua constatação de que o projeto civilizatório da sociedade burguesa, locomotiva da vida moderna, promove a degeneração da própria energia criativa do ser humano, que se emancipou, de certa maneira, das correntes teológicas, mas se aprisionou nos grilhões da tecnocracia, da burocracia, do trabalho exaustivo e alienado, na correria do tempo urbano desprovido de reflexão, marcado pela agitação histriônica que excita de maneira doentia o sistema nervoso do sujeito que encontra na sofreguidão do trabalho seu caminho para a prosperidade material e inerente aceitação social na sociedade de consumo. O homem moderno é assim um ser despersonalizado, neurastênico, constantemente a procura de si mesmo sem, contudo, lograr êxito:

As pessoas já se envergonham do descanso; a reflexão demorada quase produz remorso. Pensam com o relógio na mão, enquanto almoçam, tendo os olhos voltados para os boletins da bolsa – vivem como alguém que a todo instante poderiam perder algo. Melhor fazer qualquer coisa do que nada – este princípio é também uma corda, boa para liquidar toda cultura e gosto superior (NIETZSCHE, 2012, p. 193).
A experiência da reflexão, do silêncio e do ócio são assim imputadas como perda de tempo, e tempo é dinheiro vivo que não pode ser desperdiçado com caprichos pessoais. A moral do desempenho requer que toda a força produtiva individual seja destinada para o trabalho pró-empresa, o totem mercadológico que deve ser adorado por cada sujeito inserido no sistema tecnocrático de produtividade. Pouco importa que a pessoa perda sua vitalidade ao dedicar mais e mais horas ao trabalho exaustivo que tanto empodera a empresa, mas que tanto degrada o próprio trabalhador.

A gênese da Modernidade Líquida
Um dos conceitos fundamentais do pensamento de Bauman é o de liquidez. Trata-se de uma atualização da célebre expressão cunhada por Engels e por Marx no Manifesto do Partido Comunista, “tudo que é sólido e estável se volatiza”, acerca do papel revolucionário da burguesia em modificar radicalmente as bases axiológicas da ordenação do mundo aristocrático-feudal:

O contínuo revolucionamento da produção, o abalo constante de todas as condições sociais, a incerteza e a agitação eternas distinguem a época burguesa de todas as precedentes. Todas as relações fixas e cristalizadas, com seu séquito de crenças e opiniões tornadas veneráveis pelo tempo, são dissolvidas, e as novas envelhecem antes mesmo de se consolidarem. Tudo o que é sólido e estável se volatiza, tudo o sagrado é profanado, e os homens são finalmente obrigados a encarar com sobriedade e sem ilusões sua posição na vida, suas relações recíprocas (ENGELS & MARX, 2010, p. 69).

A proeminência burguesa, no decorrer da Modernidade, porém, adquire tons extremamente reacionários, exercendo na estruturação social uma hegemonia tão repressiva como aos dos poderes do Antigo Regime. No entanto, o ethos burguês é grosseiramente inferior ao do espírito aristocrático, pois este, apesar dos seus caprichos, do seu egoísmo faustuoso, das suas irresponsabilidades monetárias, dos seus disparates contra o bem-estar comum, era dotado de bom gosto, refinamento estético e requinte, enquanto a ideologia burguesa é essencialmente filisteia, pois mensura a gestão pessoal a partir de critérios pecuniários, onde ter algo é garantia de gozo e de segurança existencial. Nesse contexto, Bauman, ao conceder dignidade filosófica ao conceito de liquidez, insere-se na aporia acerca da superação ou não da Modernidade, e como compreendê-la em suas ambivalências.
O caráter emancipatório da Modernidade revela sua liquefação através da hipérbole das suas contradições irresolutas. As garantias trabalhistas adquiridas pelas sangrentas lutas proletárias se dissipam graças ao ajuste neoliberal que defende os interesses empresariais em detrimento da qualidade de vida dos trabalhadores (gerando incertezas existenciais e condições precárias análogas ao do escravismo), as relações amorosas perdem sua densidade e senso de investimento em longo prazo (com seus fracassos e sucessos) para se tornarem naturalmente efêmeras e descartáveis (onde impera a lógica do descarte do parceiro amoroso tão logo ele tenha nos fornecido o prazer que queríamos obter), os discursos extremistas dos fascistas que ainda se encontram vivos e cada vez mais fortalecidos nas sociedades ditas democratizadas ganham mais adesão dos setores medianos das mesmas, em uma mescla de mitificação ideológica, irracionalismo, apologia da truculência e da ignorância, moralismo seletivo, militarismo social, autoritarismo e patriotismo xucro. Em suma, são muitos e diversos problemas que assolam a sociabilidade moderna regida pela lógica do mercado e que evidenciam seu fracasso civilizacional, sem qualquer democracia autêntica. Bauman argumenta que:
A Modernidade descobriu que a condição de volatilidade que origina a insegurança perpétua dos atores pode ser transformada no mais fidedigno dos fatores de manutenção do modelo. A política de regulação normativa foi substituída pela “política de precarização”. A flexibilidade das condições humanas prenhe com a insegurança do presente e a incerteza do futuro acabou por ser vista como sendo a melhor matéria prima para a construção de uma ordem forte e resistente; a vida segmentada em episódios sem peias ao passado nem amarras ao futuro elimina o desafio de estabelecer a ordem de uma forma mais radical do que fizeram as mais elaboradas (e exorbitantemente caras) instituições de vigilância panóptica e de administração cotidiana (BAUMAN, 2010, p. 224-225).

Todo desenvolvimento técnico não foi capaz de fornecer ao ser humano a segurança existencial, ansiosamente perseguida de modo ineficaz pelos sujeitos em suas histórias de vida. O Estado Moderno advém como um órgão pretensamente depurado dos seus elementos contrários ao bem comum republicano, mas na verdade perpetua suas diatribes excludentes contra os grupos sociais desprovidos de poder econômico capaz de lhes conceder a cidadania e o inerente acesso aos direitos legais:

Desde o início o Estado moderno confrontou-se com a desestimulante tarefa de gerenciar o medo. Teve de tornar a tecer a rede de proteção que a revolução moderna destruiu, e continuar a consertá-la enquanto a modernização por ele promovida continuava a deformá-la e desgastá-la (BAUMAN, 2006, p.98).

Por conseguinte, ao se tornar um mecanismo tecnocrático que propositalmente defende os interesses privados de uma minoria em detrimento dos anseios populares, o organismo estatal se torna, ele mesmo, responsável pelos conflitos intestinos na sociedade moderna e sua violência onipresente. Os pobres da sociedade de afluência, genuínos condenados da Terra, após repressões exaustivas dos mais diversos níveis, são obrigados, pela força da repressão oficial, a se adequarem ao modus operandi da violência bruta. Suas vozes se emudecem perante a dominação desse sistema que estabelece quem são os “bons” e os “maus”:
Cada vez mais, ser pobre é encarado como um crime; empobrecer, como o produto de predisposições ou intenções criminosas – abuso de álcool, jogos de azar, drogas, vadiagem e vagabundagem. Os pobres, longe de fazer jus a cuidado e assistência, merecem ódio e condenação – como a própria encarnação do pecado (BAUMAN, 1998, p. 59).

Os abastados membros da sociedade de consumo, cidadãos economicamente viáveis, alheios ao caráter miserável e excludente da gestão capitalista, fecham seus olhos para essa degeneração republicana e se escondem nos shoppings, nos condomínios e nos paraísos fiscais do mundo, afirmando assim a lógica da identidade idiota, pois somente se esforçam para tentar mudar positivamente a ordem das coisas quando eles mesmos são afetados pelos efeitos destrutivos das revoltas sociais:

Quanto mais as pessoas permanecem num ambiente uniforme – na companhia de outras “como elas” com as quais podem ter superficialmente uma “vida social” praticamente sem correrem o risco da incompreensão e sem enfrentarem a perturbadora necessidade de traduzir diferentes universos de significado –, mais é provável que “desaprendam” a arte de negociar significados compartilhados e um modus convivendi agradável (BAUMAN, 2007a, p. 94).

Todavia, a tendência geral dessas classes soberbas é lutar ferrenhamente contra a ignominiosa proletarização do seu próprio nível de vida e, assim, elas se empenham na defesa de medidas reacionárias contra os avanços dos deserdados da festa capitalista, legitimando toda sorte de barbáries políticas para reprimir os golpes dos miseráveis que, em verdade, são criações das próprias elites, incapazes, contudo, de reconhecer sua culpa prática nesse processo de espoliação econômica. O abismo social entre a seleta plutocracia e a horda global de anônimos representa a incapacidade de nosso sistema econômico violento e excludente integrar as pessoas em uma sociedade orgânica, viva e intensa. Quem não é rentável é descartável:

A vida na sociedade líquido-moderna é uma versão perniciosa da dança das cadeiras, jogada para valer. O verdadeiro prêmio nessa competição é a garantia (temporária) de ser excluído das fileiras dos destruídos e evitar ser jogado no lixo. (BAUMAN, 2007b, soberba, o pobre deve ser sempre alguém submisso, pronto para servir docilmente aos seus caprichos senhoris: p. 10).
Nada mais incômodo para os esnobes que a convivência forçada com pessoas de substratos sociais inferiores nos mesmos espaços de circulação. Para essa malta

As elites escolheram o isolamento e pagam por ele prodigamente e de boa vontade. O resto da população se vê afastado e forçado a pagar o pesado preço cultural, psicológico e político de seu novo isolamento (BAUMAN, 1999, p. 29).

A experiência do medo se caracteriza talvez como a disposição fundamental da condição humana, pois nenhum dispositivo foi capaz, no decorrer das eras, de eliminar ou ao menos atenuar seus efeitos mais impactantes nas estruturas sociopolíticas das nações. Todos os esforços racionais da intelligentsia moderna não foram suficientes para esclarecer a sociedade e assim suprimir o medo da vida e seus elementos mais contrastantes. O medo que não é superado convenientemente em atos de enfrentamento dos desafios existenciais, em fortalecimento do ânimo corajoso, incentiva erupções de ódio contra as figuras ou grupos imputados como os responsáveis justamente pelo despertar do medo:
O medo do desconhecido – no qual, mesmo que subliminarmente, estamos envolvidos – busca desesperadamente algum tipo de alívio. As ânsias acumuladas tendem a se descarregar sobre aquela categoria de “forasteiros” escolhidos para encarnar a “estrangeiridade”, a não-familiaridade, a opacidade do ambiente em que se vive e a indeterminação dos perigos e das ameaças (BAUMAN, 2009, p. 36-37)
Outrora, o medo era direcionado para alvos mais facilmente detectáveis, ainda que pautados em acepções abstratas, e convenientemente manipulados pelos poderes estabelecidos para que em ações catárticas as fontes maléficas do medo fossem eliminadas (bruxas, hereges, ciganos, andarilhos, vagabundos, leprosos, estrangeiros, assassinos, ladrões). Na modernidade líquida, como a ordem capitalista evidenciou sua inépcia em promover justiça social e como tal modelo corrupto de gestão governamental cada vez mais jogou a coisa pública na falência geral, o Estado, comandado por elites defensoras da plutocracia, não consegue conduzir convenientemente a sociedade para um patamar de progresso genuíno, bem-estar, acesso aos recursos materiais indispensáveis para a efetivação da qualidade de vida do cidadão:

Os medos nos estimulam a assumir uma ação defensiva. Quando isso ocorre, a ação defensiva confere proximidade e tangibilidade ao medo. São nossas respostas que reclassificam as premonições sombrias como realidade diária, dando corpo à palavra. O medo agora se estabeleceu, saturando nossas rotinas cotidianas; praticamente não precisa de outros estímulos exteriores, já que as ações que estimula, dia após dia, fornecem toda a motivação e toda a energia de que ele necessita para se reproduzir. Entre os mecanismos que buscam aproximar-se do modelo de sonhos do moto-perpétuo, a autorreprodução do emaranhado do medo e das ações inspiradas por esse sentimento está perto de reclamar uma posição de destaque (BAUMAN, 2007, p. 15).
O resultado é uma guerra civil urbana na qual ninguém mais está seguro. O medo de sofrer as agruras de uma morte violenta incentiva posturas reativas nas pessoas, que vivem em nível elevado de tensão psíquica, encontrando em cada interlocutor um possível inimigo feroz que deve preventivamente ser eliminado, tal como uma guerra ubíqua realizada nas ruas, no trânsito, em todos os locais de choque e de interação ruidosa e forçada. Por isso parlamentares oportunistas defendem a legalização do uso das armas de fogo, como se a população armada pudesse vencer a violência que nasce, em verdade, da perpetuação das injustiças sociais. O fascismo prospera onde o espírito reativo do medo baseia sua compreensão limitada da realidade através da mitificação política, como se houvesse um líder capaz de, por sua força de vontade, libertar os “cidadãos de bem” do abismo do caos. Massas orientadas pela voz odiosa de um governante corroído pelo verme do ódio, da barbárie, da insensatez. A gestão política do Estado em sua configuração ultraliberal associada ao fascismo de mercado promove uma ação dúbia na condução da vida social, pois requer a instauração de um contínuo regime de exceção para controlar o comportamento individual em um evidente conservadorismo social, mas ao mesmo tempo pressupõe que cabe ao sujeito a responsabilidade em se proteger das ameaças violentas, daí o seu nefasto espírito armamentista. Conforme Bauman,

O tipo de incerteza, de obscuros medos e premonições em relação ao futuro que assombram os homens e mulheres no ambiente fluído e em perpétua transformação em que as regras do jogo mudam no meio da partida sem qualquer aviso ou padrão legível, não une os sofredores: antes os divide e os separa (BAUMAN, 2003, p. 48).
Dessa maneira, chegamos a uma polarização extremista das contradições modernas, pois alcançamos nível elevado de produção de conhecimento, mas encontramos ainda expressões de ignorância irmanadas com a barbárie. A democratização social, não obstante seu caráter formal em muitas constituições nacionais, não gerou efetivas gestões públicas promotoras da justiça, da qualidade de vida, da segurança e da isonomia dos seus cidadãos. Torna-se, assim, imprescindível uma revolução social que promova uma nova governança política cujo mote primordial seja a emancipação humana de cada pessoa perante toda forma de poder que coloca a vida submetida ao crivo de dispositivos tecnocráticos que dependem justamente do aniquilamento da ideia de homem para que obtenham rentabilidade e lucratividade.
As obras de Bauman demonstram o seu compromisso filosófico para com o esclarecimento crítico, apresentando as ambivalências da modernidade e possíveis soluções para os seus impasses, mas suas ideias não são fórmulas que, uma vez cumpridas à risca, permitirão a satisfação das demandas pessoais dos interessados. Toda atividade intelectual se equilibra sobre a contingência, característica crucial das humanidades, de modo que precisões ou verdades absolutas lhe são assim estranhas. A obra de Bauman permanecerá com sua intensidade legítima se seus leitores não o mitificarem como o enunciador da palavra soteriológica, caso contrário não teremos de estranhar se encontrarmos, algum dia, um louco versando sobre bênçãos líquidas que absolverão os pecados do homem moderno, alienado e transtornado. O panorama apresentado é talvez desalentador, mas uma das etapas de transformação da realidade exige que reconheçamos a miséria instituída, para que possamos posteriormente atuar na reconstrução desse mundo doente e apocalíptico.

Referências bibliográficas

BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Trad. de Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.
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________. A sociedade sitiada. Trad. de Bárbara Pinto Coelho. Lisboa: Instituto Piaget, 2010.

________. Tempos Líquidos. Trad. de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007a.
________. Vida Líquida. Trad. de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007b.
ENGELS, Friedrich; MARX, Karl. Manifesto do Partido Comunista. Trad. de Marco Aurélio Nogueira e Leandro Konder. Bragança Paulista: Ed. Universitária São Francisco / Petrópolis: Vozes, 2010.
KANT, Immanuel. O conflito das faculdades. Trad. de Artur Morão. Lisboa: 70, 1993.
NIETZSCHE, Friedrich. O Anticristo. Trad. de Artur Morão. Lisboa: Ed. 70, 1997.
_________. A Gaia Ciência. Trad. de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.