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História e dialética simplificada

Este trabalho é uma revisão de outro (Dialética em papel de embrulhar prego para a história), a fim de corrigir algumas grosserias pela qual peço perdão aos amigos e agradeço pela consideração.

 A dialética como instrumento para entender a práxis (prática, aqui para nós, entendida como ato da mudança que causa como efeitos: os movimentos sociais), em determinados aspectos torna-se complexa até para quem a expõem em aulas de história. Assim sendo, torna-se necessário a vermos de forma simples e direta ao público porque todo o conhecimento por mais simples que seja deve ser universal para que se tenha o mínimo de arcabouço teórico para uma discussão sobre o tema.

A dialética entendida modernamente nasce com Hegel de fato, porém, foi Marx que a inverteu para o materialismo histórico, ou seja, ela deixa de ser a busca do conhecimento absoluto em Hegel (idealismo) e passa a ser interpretada como explicação para as “relações sociais de produção” (realidade material onde o homem através do seu trabalho, consegue os meios necessários à sua sobrevivência) em suas transições dos “modos de produção” (escravista, servil, pré-capitalista e capitalista), através da luta de classes (o motor da história para Marx).

É lugar comum nas teorias dos historiadores, afirmar que o homem é o sujeito da história:

 Ex.: você reparou que você vive o tempo todo atrás de dinheiro, e que vc gasta a maior parte da sua vida para produzi-lo e que seu reconhecimento social depende dele, porque é através dele é que você pode barganhar com a sociedade, consumir coisas, em regra geral atrair pessoas (pois quem tem dinheiro pode proporcionar coisas). Isto posto, pode-se dizer que você não se realiza para si e em si, mas sim você se realiza para o capital...logo então você não é sujeito (porque não pode se realizar por mais dinheiro que possua), mas também não é objeto (porque faz história), então você é o suporte da história. Veja porque Marx entendeu desta forma!

Para Marx, o homem somente poderia ser sujeito da história se ele se realizasse plenamente, produzindo para-si e para-outro, ou seja, sem ter que se preocupar na maior parte do tempo com a sobrevivência de uma determinada estrutura de produção, podendo dedicar-se livremente (sem atrelamento comercial) por exemplo: a arte, ao lazer e à outras formas de cultura. Como não é assim a realidade material, Marx passa a entender que não existe a “história do homem”, mas sim, a história dos predicados do homem, assim sendo, o homem ainda está em sua pré-história. Porém, homem não é sujeito, mas também não é objeto, ele é então o suporte da História, em sua relação de trabalho onde os sujeitos da história são: os modos de produção. Para entendermos melhor, observe os exemplos:

Temporalidade: Antigüidade, modo de produção escravista, sujeito histórico = o escravismo (que também é objeto), homem = Sr. de escravos ou escravo (suporte do modo de produção escravista), pois o homem não vive para si, e sim, para reproduzir a escravidão (sujeito e objeto).

Temporalidade: Idade Média, modo de produção servil, sujeito histórico = a servidão (que também é objeto), homem = Sr. feudal ou servo (suporte do modo de produção servil), pois o homem aqui não vive para si, e sim, para reproduzir a servidão (sujeito e objeto).

Temporalidade: 1Idade Contemporânea, modo de produção capitalista, sujeito histórico = o capital (também é objeto), homem = Capitalista ou assalariado (suporte do modo de produção capitalista), pois aqui também o homem não vive para si e sim para a produção e reprodução do capital. Então, escravo, servo, assalariado, Sr. de escravos, senhor feudal, patrão capitalista, são predicados do homem, e não sujeitos históricos.

Entendido os porquês de o homem não ser o sujeito da história e sim, o seu suporte e que não existe ainda a História do Homem, o que existe sim é sua pré-história. Poder-se-á falar agora em dialética na visão marxista.

A dialética (tese, antítese e síntese) é o movimento histórico que denomina-se de luta de classes pelo qual surgem as sínteses (o resultado da luta de classes), como os conflitos de interesses entre o escravo e o senhor de escravo, somada a crise estrutural, faz com que surja o processo que ocasionará o feudalismo. E por sua vez, o conflito entre servo e senhor feudal, faz com que surja outra crise estrutural que ocasionará o pré-capitalismo (Idade Moderna), e por fim o capitalismo (Idade Contemporânea).

Porém deve-se aqui ressaltar que Marx era um homem de sua época, ou seja, que ele estava limitado pelas idéias de sua época, assim sendo, suas idéias expressam um determinismo histórico comum ao século XIX, como o darwinismo e o idealismo hegeliano, descontada a questão teleológica, Observe os exemplos abaixo:

senhor de escravo, senhor feudal, capitalista = tese

escravo, servo, assalariado = antítese

síntese é o resultado do conflito entre esses segmentos, por ex.: o escravismo é a síntese (tese x antítese) da crise das sociedades comunais primitivas com o surgimento da sociedade privada (Engels). Assim como o feudalismo é a síntese (tese x antítese) do conflito de classes entre senhores de escravos e escravos. E por fim, o capitalismo que é a síntese (tese x antítese) entre assalariados e capitalistas e que resultaria no socialismo e assim por diante. Simplificando ainda mais, exemplificar-se-á através do cotidiano da vida privada (família, amigos etc..): Um sujeito torna-se pai, e a criança (nova realidade histórica pessoal do pai) por ser ainda muito nova ainda não consegue caminhar normalmente – enquanto ela não sente firmeza nas pernas, continua a apoiar-se no pai segurando-lhe as mãos, porém, ao conseguir firmar-se, ela passa a recusar cada vez mais a mão do pai por sentir auto-segurança, ou seja, conseguiu superar sua realidade anterior. À medida que vai se desenvolvendo a criança ela vai superando a realidade de dependência do pai e quando finalmente torna-se adulto, esse adulto será a síntese que superou a realidade do pai, e o pai agora será cada vez mas dependente do filho, pois o pai é a realidade finalmente superada, em resumo: pai = tese, filho = antítese e o embate entre essas duas realidades (pai e filho), será a síntese desse confronto, aqui pode-se até materializar essa síntese na figura do neto por exemplo.   

Antes de dar-se continuidade, deve-se entender que o socialismo real (principalmente aquele da ex – URSS), não vingou devido a não contemplação da revolução; que seria a “ditadura do proletariado”, que nunca existiu em toda a história – mas sim, uma espécie de socialismo de discurso que favorece determinados segmentos no poder, aqui neste caso, os burocratas, pois deve-se entender que o coletivismo não é socialismo, e que a máquina burocrática adota um discurso de guerra para legitimar-se enquanto necessidade ao poder  quase chegando a uma espécie nova de ditadura da burocracia onde apenas o discurso somado a algumas práticas corporativistas, deixando-se de investir no padrão de vida dos seus cidadãos e investindo no silêncio medo e na força do Estado.

As classes sociais

Para tal, deve-se também compreender o que é classe e também entender que ela sofre um processos histórico dialético.

A classe é sociologicamente expondo, estabelecida pela divisão entre capital e trabalho (burguesia e proletariado). Na contemporaneidade, devemos distinguir isso claramente, ou seja, por exemplo: um funcionário de uma repartição pública que possua um patrimônio de várias casas e carros a rigor não é um burguês, pois, por mais que ele tenha e exerça todos os valores burgueses (do quais todos os indivíduos de toda sociedade capitalista estão impregnados), ele não possui o que é essencial para ser burguês a rigor, ou seja, os meios de produção (terra, máquinas industriais, tecnologia de ponta, ou o próprio capital). Quanto aos antigos proletários, mas corretamente denominando-se: assalariados, para formarem uma classe, é necessário, que se possua uma “óptica de classe”. Exemplificando, quer dizer; se um indivíduo se diz professor, estudante, comerciário, bancário, autônomo, médico, engenheiro, advogado etc.. ele está referindo-se a si mesmo como categoria, categoria: dos estudantes, dos operários, dos professores. Então quando o indivíduo passa a ser um sujeito histórico, automaticamente possará a ver e interferir politicamente observando (óptica de classe) todas essas categorias juntas como uma classe, ou seja, como a classe dos trabalhadores sem fazer distinção – como distinção quer dizer-se: sem gênero (homem/mulher), sem pátria (brasileiro/não brasileiro), sem regionalidade (ser do sudeste, do sul, do nordeste ou do norte) – pois todos a rigor são trabalhadores, em sua maioria assalariados.

A classe também não é homogênea e pode ser volátil, ou seja, por exemplo: muitos trabalhadores quando chegam ao poder, modificam suas atitudes mantendo apenas seus discursos (às vezes nem isso). Isso porque a classe não é uma “coisa” homogênea e atemporal, por exemplo, a classe média sofre de uma ambigüidade de valores, pois quando está prestes a sofrer algum empobrecimento acelerado ela está ao lado dos assalariados empobrecidos, mas quando, está confortavelmente bem estabelecida; geralmente permanece numa posição mais conservadora. Outro exemplo, quando as categorias (professores, metalúrgicos, comerciários etc..) não têm o poder de mando, as conjunturas históricas favorecem que elas se tornem classe (dos trabalhadores), mas, muitas das vezes superadas algumas adversidades (aumento de salários, divergências internas e externas em uma determinada categoria), a classe pode enfraquecer e até desfazer-se. O que podemos dizer que pode haver uma “luta de classe sem classe”, pois em um determinado momento histórico ela é classe em outro momento pode não sê-la. Daí, ser necessário dar-se outra interpretação da dialética junto à cultura Que será um capítulo à parte na continuidade deste trabalho.

Mário Araújo

Curso de História (UFPa)

 

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[1] Não se referiu aqui à Idade Moderna, por entender-se que se trata de um período de transição entre a medievalidade e a contemporaneidade, ou seja, um período pré – capitalista.

 

BIBLIOGRAFIAS

CHAUÍ, Marilena. “Convite à Filosofia”. 1ª edição,  Editora Ática. São Paulo – SP. 1997.

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BOBBIO, Noberto. “Ensaios sobre Gramsci e o conceito de sociedade civil”. Editora Paz e Terra. São Paulo – SP. 1999.

MARX, Karl. “A questão judáica”. Editora Moraes. São Paulo – SP. 1989.

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THOMPSON, E. Palmer. Misery and Power the Phylosophy. Oxford. EUA. 1980.

 

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